Quando a pandemia da covid-19 foi decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em março de 2020, há dois anos, um grupo de pesquisadores já acompanhava, também na China, a evolução de um vírus que começava a infectar humanos.
Agora, em um estudo publicado no New England Journal of Medicine, o grupo anuncia que o novo patógeno, o Langya henipavirus (LayV), foi identificado em 35 pessoas nas províncias de Shandong e Henan, causando alguns sintomas similares à primeira fase da covid-19, como febre alta, cansaço e tosse.
Os pesquisadores, liderados por Xiao-Ai Zhang e Hao Li, ambos do Instituto de Microbiologia e Epidemiologia de Pequim, informaram que as amostras coletadas no estudo eram muito pequenas para determinar se há ou não a transmissão de humanos para humanos, mas eles não descartam essa hipótese. No artigo, ressaltam que se trata de uma “descoberta que merece investigação adicional para entender melhor a doença humana associada”, sinalizando a importância de se manter em alerta para evitar uma nova epidemia. A opinião é compartilhada por Werciley Júnior, coordenador de infectologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília. “O novo vírus está restrito a regiões da China, mas pode chegar a outras partes do mundo”, justifica.
Segundo autoridades de saúde chinesas, os pacientes não tiveram contato próximo entre eles, o que sinaliza que as infecções humanas podem ser esporádicas. A equipe acompanhou, entre abril de 2018 e agosto de 2021, pacientes de hospitais populares da China, com o intuito de realizar triagens em doenças zoonóticas (transmitidas de animais para humanos) suspeitas. Pessoas com febre aguda (acima de 38°C) e um histórico de exposição animal dentro de um mês antes do início das complicações foram recrutadas para o estudo.
Exames de sangue e de secreções da garganta indicaram o novo vírus. Existem outros dois patógenos do mesmo gênero — o Hendra henipavirus (HeV) e o Nipah henipavirus (NiV) —, que têm alto grau de letalidade em casos de infecção grave. Nos casos apresentados no New England Journal of Medicine, não houve óbitos nem complicações críticas. Os sintomas apresentados pelos infectados foram febre (100% dos pacientes), fadiga (54%), tosse (50%), anorexia (50%), dores musculares (46%), náusea (38%), cefaleia (35%) e vômitos (35%).
Após a identificação do LayV, a equipe fez uma investigação epidemiológica dos pacientes infectados e seus familiares de contato próximo por meio de um questionário padrão, que incluía dados demográficos e doenças de base preexistentes, além do histórico de exposição antes do início de doenças. Assim, a equipe constatou que a transmissão pode ter ocorrido por animais ou frutas infectados.
Selvagens e domésticos
Testes em 25 espécies de animais selvagens sugerem que o musaranho — um mamífero parecido com camundongos — pode ser um reservatório natural do LayV. Há também casos de infecções em animais domésticos, como cães, e cabras de alguns infectados. Análises do genoma do vírus indicam que ele tem uma organização genômica idêntica à de outros henipavírus, que, como indicam o artigo, são “conhecidos por infectar humanos e causar doenças fatais”.
É a primeira vez que o LayV é identificado em humanos. Por isso, não há tratamento específico para essa infecção. No caso dos outros henipavírus, há terapias em investigação. Pesquisadores da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, publicaram, em março, na revista Science, que descobriram detalhes sobre como o Nipah e o Hendra atacam as células e as respostas imunes que tentam combater essa infecção, abrindo espaço para novas frentes terapêuticas, incluindo vacinas.
Com informações do Correio Braziliense.