Aposentados que tiveram descontos indevidos de seus benefícios recebidos de seus supostos advogados menos de 20% da indenização que obtiveram na Justiça
A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) está participando em casos de vítimas de fraude do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Novo Airão, a 194 quilômetros de Manaus, que não conseguiram receber o valor integral de indenização concedida pela Justiça. Os investidores relataram à Defensoria que foram enganados por supostos advogados e tiveram acesso a menos de 20% do que têm direito.
Até o momento, três idosos procuraram a DPE-AM no município com relatos semelhantes e todos com o mesmo perfil: aposentados com pouca escolaridade que foram prejudicados por uma instituição financeira que concedeu descontos nos benefícios do INSS.
Eles contaram que, entre 2022 e 2023, foram envolvidos por uma mulher que ora se apresentou como funcionária do INSS, ora como representante de um escritório de advocacia. A mulher questionou dados bancários e descontos indevidos feitos pelo banco BMG. Meses depois desse primeiro contato, foram informadas que tiveram sentença de procedência em uma ação judicial contra o banco para recuperar o valor debitado indevidamente.
A sentença foi favorável em todos os casos, mas o valor devido para cada um deles foi bem maior do que os valores que lhes foram repassados.
“Essas pessoas foram duplamente prejudicadas. Primeiro, porque houve um desconto indevido no benefício e segundo por esse suposto escritório de advocacia que entrava com a ação”, disse a defensora pública responsável pelo caso, Saelli Miranda.
Um caminhão contratado foi um motorista das vítimas que buscou a Defensoria Pública. “A mulher veio em casa com umas conversas bonitas e eu até assinei um papel para ela. Depois, sem saber o que era, ela acionou o banco na Justiça sem que eu autorizasse, nem nada. Agora, veio esse outro problema e eu fui prejudicado, porque o banco pagou uma quantia, mas não me devolveu nem 20%. A indenização foi R$ 8.500 e só me devolveram R$ 2.500. Eu gostaria de ser recompensado por isso, porque eu não vou perder isso aí”, disse.
O documento assinado era uma cessão de crédito, que permitiria, em tese, aos supostos advogados o resgate integral da indenização.
A outra vítima, a indenização indenizada pela Justiça foi de R$ 20.024, mas o valor pago para ela foi de apenas R$ 2.000.
Na maior parte dos casos, os prejuízos giraram em torno de 80% do valor devido.
Uma pensionista de 66 anos relatou que chegou a concordar com a ação judicial, mas foi informada pela mulher, concluída a advogada, que deveria aceitar um acordo menos que o previsto. A ela, foi pago menos de 10% do valor devido.
“Ela veio aqui em casa mais uma vez dizendo que eu não tinha ganhado a causa e me ofereceu dois mil reais para o processo não ir para frente, que eu não tinha ganhado. Tudo bem. Eu estava ‘aperreada’ e peguei os dois mil, sendo que eu tinha ganhado mais de 26 mil reais”, lamentou a beneficiária.
A DPE-AM já se manifestou em todos os casos em que foi procurada. “A Defensoria é muito importante para garantir o direito desses aposentados, pois a maioria deles não tem condições de contratar um advogado particular para atuar em seus casos e garantir a efetivação de seus direitos. Além disso, eles são de um grupo especialmente vulnerável cuja tutela é especialmente relevante, pois mais suscetíveis a golpes”, declarou um defensora.
A Defensoria Pública fez um levantamento no fórum do município sobre o assunto e encontrou pelo menos 40 casos semelhantes.
Na condição de “guardiã dos vulneráveis” (Custos Vulnerabilis), a Defensoria se manifesta em cada um dos processos e, agora, busca garantir o pagamento integral da indenização para os aposentados.
“Esse caso atuamos como Custos Vulnerabilis, com fundamento em uma tese criada por Maurilio Casas Maia, defensor da DPE-AM. Essa teoria, já aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), diz em linhas gerais que a Defensoria Pública é guardiã dos vulneráveis. Então, por isso, pode atuar em casos no qual algumas pessoas ou grupo de pessoas vulneráveis estão litigando, ainda que essas pessoas já tenham advogado e não procurem a Defensoria Pública”, explicou Saelli Miranda.
A DPE-AM encaminhou ofício apresentando os casos ao Ministério Público do Amazonas (MPAM), para apuração de eventuais danos coletivos e crimes praticados por esses supostos advogados. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também foi informada sobre o ocorrido.
A Defensoria Pública está à disposição para ouvir as vítimas de Novo Airão que ainda não entraram em contato com a instituição.
Atuação previdenciária no interior
A defensora Saelli Miranda explicou que, nas comarcas do interior que têm vara da Justiça Federal, a DPE-AM atua para proteger os direitos dos beneficiários do INSS.
O entendimento do STF é de que a competência para atuação em litígios previdenciários pode ser da Justiça Estadual no caso de comarcas que não tenham vara da Justiça Federal, como no caso de Novo Airão, casos em que a Defensoria Pública Estadual terá atribuição para atuar.
“O assistido que reside no interior e tiver algum problema relacionado a descontos em benefícios previdenciários, pode procurar a Defensoria Pública do Amazonas. Em cidades que não têm sede da Justiça Federal, podemos atuar. Eu já entrei, inclusive, com várias ações contra o INSS no Município de Novo Airão, conseguindo várias sentenças de procedência, porque o entendimento do STF permite essa atuação”,.
Foto: Junio Matos/DPE-AM